Desafio Praias e Trilhas, depois não diga que eu não avisei
Por: Sportclick News em Últimas Notícias • 27/10/2011
Não é ultramaratona nem corrida de montanha, será preciso criar uma nova modalidade para definir a loucura que é o Desafio Praias e Trilhas de 84km em Florianópolis. Já tinha ouvido falar que é uma prova de alto grau de dificuldade, mas não era só isso, com o corpo esfolado após rolar em uma ribanceira descobri que tinha muito mais para saber.
Em um calendário de 7 ultramaratonas, escolhi o Desafio Praias e Trilhas para encerrar a minha temporada 2011. Fui com um único desejo, aproveitar aquele momento simbólico com bastante intensidade, como parte da comemoração de um ano de grandes conquistas. Sorte a minha!
Era sábado de manhã, a balança da organização marcava 65,100 kg, mesmo após um jantar reforçado de massas & batatas em uma confraternização com a presença de todos os corredores na noite anterior. Faltava pouco para a largada na localidade de Caieiras, no sul da ilha. Não poderia chegar na praia da Joaquina, 42km depois, com uma perda maior do que 5% do meu peso, senão eu estaria sumariamente desclassificado para a 2ª etapa de domingo.
Ítens obrigatórios também foram checados pela organização: mochila de hidratação com capacidade para 2 litros de água, apito para pedir ajuda, atadura para estancar o sangue de um possível ferimento e manta térmica de sobrevivência. Parece um certo exagero, não é? Também achei que fosse. Além disso eu ainda carregava 7 sachês de gel de carboidrato.
Para esta prova optei calçar um tênis que usei muito pouco, um Salomon XA-Pro-3D-Ultra, uma excelente escolha para as praias e trilhas, mas uma péssima ideia para os meus pés, revelada só mais tarde.
Após o sinal sonoro de largada, começou a 1ª etapa do Desafio Praias e Trilhas. Um pequeno trecho de asfalto escondia as surpresas que estavam por vir. Em pouco tempo os fiscais já apontavam a entrada da trilha. Subimos pelo meio de uma mata fechada por mais de 30 minutos, equilibrando-se em pedras grandes e pequenas, pedaços de pau, buracos e lama. Usar as mãos para manter-se equilibrado ou como apoio era imprescindível. Quando começou a descida, o que deveria ser mais fácil ficou ainda mais difícil e perigoso. Logo ali, ao me desequilibrar e rolar ribanceira abaixo, descobri que eu estava em uma prova digamos assim, diferente. Levantei todo esfolado, alguns corredores passaram por mim “tudo bem?” – tudo bem, tive muita sorte, precisava só encontrar meu óculos de sol perdido no meio da vegetação. Estava lá, ainda inteiro. Peguei o óculos e continuei descendo até encontrar a praia. Pensei “que maravilha, agora vou correr”. Que nada, a areia era tão fofa que nos primeiros metros senti até saudades da trilha. E foi assim, subindo e descendo trilhas intermináveis e passando por praias inclinadas de areia muito fofa que cheguei na praia da Joaquina 5 horas e 56 minutos depois. Ufa. Com poucas horas de recuperação para a largada na manhã do dia seguinte, eu agora entendia perfeitamente porque essa prova é dividida em duas etapas.
Na manhã seguinte estavam todos lá novamente, prontos para a largada da 2ª etapa na praia da Joaquina. A fisionomia dos corredores, assim como meus pés e mãos, não eram mais as mesmas. A balança marcava 63,000 Kg, liberando-me para partir. Me concentrei para esquecer o estrago que a escolha equivocada do tênis havia feito em meus pés: calcanhares em carne viva, quatro unhas praticamente soltas e bolhas nas plantas dos pés; e o estrago das mãos machucadas de tanto agarrar-me em pedras e galhos. Não era hora de pensar nisso. De saída já tivemos que enfrentar as temidas dunas da Joaquina, e sem tempo para respirar nos embrenhamos na primeira de muitas trilhas daquele dia, um cenário de dificuldades muito parecido com o dia anterior. Mas o pior ainda estava por vir, eram os costões de pedra gigantescos, molhados e escorregadios. Um erro ali poderia ser fatal. Praias, trilhas e costões, um visual deslumbrante capaz de esconder armadilhas a todo instante.
Acho que falta pouco, não sei, a mistura de calor e cansaço me deixaram bastante confuso mentalmente. A sinalização, impecável durante toda a prova, já não estava tão visível aos meus olhos. Desci a última trilha e desemboquei na praia de Ponta das Canas, eu sabia que o ponto de chegada estava logo ali. Mas onde? Banhistas apontavam para a direção que eu deveria seguir. Após um sprint final e alguns metros com água do mar pela cintura, 6 horas e 52 minutos depois ultrapassei a linha de chegada, e com um salto seguido de um soco no ar comemorei o fim de uma das jornadas mais difíceis de minha vida. Com a soma dos dois dias de prova cheguei em 4º lugar em minha categoria.
Perguntas e conclusões: como os organizadores conseguiram sinalizar 84km de trilhas de difícil acesso? Parabéns a EcoFloripa por conseguir realizar uma prova de extrema dificuldade com uma organização impecável. Está é uma prova apropriada para mim? Sinceramente, acho que não. Prefiro provas onde eu possa utilizar a minha resistência para correr durante horas seguidas, mas valeu, adorei a experiência, foi inesquecível.
Merecem meu agradecimento os anjos de azul, que estavam onipresentes durante toda a prova, ajudando-me ao indicar o caminho e no abastecimento dos postos de controle. Vocês foram demais.
fonte:Ultra Zobaram